Talvez o homem que melhor compreendeu a relação entre a palavra de Deus e a esperança tenha sido um pagão, o centurião romano que, depois de ter suplicado a Jesus que curasse o seu servo doente, diante da disponibilidade imediata do Senhor, se declarou não digno que ele fosse a sua casa e lhe disse: “Diz uma só palavra e o meu servo será curado!” (Mt 8,8).
Bastava-lhe uma palavra de Cristo para ter esperança certa na salvação que Ele operou.
A fé permitiu ao centurião compreender que o que suscita esperança na palavra de Deus é o facto de ser, precisamente, uma palavra de Deus, isto é, a palavra que Aquele que faz todas as coisas dirige pessoalmente à nossa necessidade de salvação e de vida eterna.
Também Pedro o compreendeu num momento que poderia ter sido de desespero, porque todos tinham abandonado o Senhor e apenas alguns discípulos desajeitados e inseguros tinham ficado com Ele: “Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna” (Jo6,68). As palavras de Jesus permaneciam para Pedro e os seus companheiros como o último fio de esperança numa plenitude de vida que podiam esperar apenas de Deus.
Mas porquê e como a esperança de Pedro, como a do centurião, podia agarrar-se à palavra de Cristo? O que é que dá à palavra do Senhor esta potência, esta solidez que permite abandonar-se a ela com todo o peso da vida com todo o peso da nossa vida que corre o risco de cair no desespero, na morte, no nada? O que é que permite a quem escuta esta palavra reconhecer que a Ele que a pronunciasse pode abandonar com toda a confiança? Isto é possível se a palavra do Senhor chega ao coração não como promessa de algo, mas como promessa de alguém, e de alguém que ama a nossa vida com um amor omnipotente, que pode tudo por aqueles que ama e se confiam a Ele. Muitos abandonaram Jesus, após o discurso sobre o pão da vida na sinagoga de Cafarnaum, dizendo: “Esta palavra é dura! Quem a pode escutar?” (Jo 6,60). Como é que a palavra de Jesus era para eles um motivo para se irem embora, quando para Pedro e os outros discípulos era a única razão para ficarem com ele?
O facto é que os primeiros tinham escutado a sua palavra, separando-a da sua fonte, o próprio Cristo. Pedro e os discípulos, pelo contrário, não podiam abstrair nenhuma palavra de Jesus da sua presença, isto é, da sua relação com Ele, da sua amizade. A palavra de Deus pode ser fonte de esperança se para nós Deus permanece a fonte da própria palavra. Só se escutamos a palavra da voz do Verbo presente, que nos olha com amor, é que ela pode alimentar em nós uma esperança inabalável, porque fundada numa presença que nunca falha. A palavra de Deus é uma promessa na qual não só aquele que promete é fiel, mas permanece incluído na própria promessa, porque Cristo nos promete Ele mesmo. “E eis que estou convosco todos os dias, até ao fim do mundo!” (Mt 28,20). A última palavra de Jesus, a última promessa antes de ascender ao céu, é a promessa de si mesmo à nossa vida, não só no fim dos tempos, mas cada dia, cada momento da vida.
Esta ligação indelével da palavra de Deus com a sua presença, tão radical desde que “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14) até morrer na cruz por nós, é a consciência e a promessa de todo o Antigo Testamento. Como quando o Salmo 27 grita ao Senhor: “Se tu não me falas, sou como os que descem à sepultura!” (Sl 27,1). O homem tem dentro de si a consciência profunda, ontológica, de que, se Deus não lhe fala, se Deus não o cria a cada momento com a sua palavra, para ele é inevitável a morte, a dissolução da vida, porque Deus cria dizendo tudo no Verbo por meio do qual existem todas as coisas (cf. Jo 1,3).
Pode-se viver sem escutar a Palavra que nos faz com amor, mas assim faz-se experiência, como tantos hoje, de uma vida inconsistente, de uma vida dissipada, que escapa das nossas mãos incapazes de a segurar. Em vez disso, é-nos dada a graça de viver escutando, de viver no desejo de escutar o Senhor que está constantemente à porta da nossa liberdade, batendo e pedindo para entrar. É-nos dado viver escutando a sua voz que nos chama à comunhão com Ele (cf. Ap 3,20), a uma amizade infinita, permitindo assim que o Espírito gere em nós e entre nós uma vida nova, transbordante de esperança, não em alguma coisa, mas em Deus que cumpre a promessa da sua presença no mesmo instante em que a sua palavra a exprime.
Dom Mauro-Giuseppe Lepori, OCist
A b a d e G e r a l d a O r d e m d e C i s t e r